Biografia:
"Que falta nesta cidade? Verdade./ Que mais por sua desonra? Honra. Falta mais que se lhe ponha? Vergonha./O demo a viver se exponha/ Por mais que a fama a exalta/ Numa cidade onde falta/ Verdade, honra e vergonha." Assim Gregório de Matos abre um poema criticando a Bahia de seu tempo. A sátira política tornou-se uma das vertentes mais conhecidas de sua obra poética.
Gregório de Matos Guerra era o terceiro filho de um fidalgo português, estabelecido no Recôncavo baiano como senhor de engenho, e de uma brasileira. Ao contrário dos irmãos mais velhos que não se adequaram aos estudos e dedicaram a ajudar o pai na fazenda, Gregório recebeu instrução na infância e adolescência e foi enviado para a Universidade de Coimbra, onde bacharelou-se em direito.
Teria sido juiz do Cível, de Crime e de Órfãos em Lisboa durante muitos anos. Na Corte portuguesa, envolveu-se na vida literária que deixava o maneirismo camoniano e atingia o barroco, seguindo as influências espanholas de Gôngora e Quevedo. Por essa ocasião, teria também casado e tido acesso ao rei Pedro 2o, de quem ganhou simpatia e favores.
Sua sorte, porém, mudou bruscamente. Enviuvou e caiu em desgraça com o rei, segundo alguns biógrafos, por intriga de alguém ridicularizado em um de seus poemas satíricos. Acabou retornando à Bahia em 1681, a princípio trabalhando para o Arcebispo, como tesoureiro-mór, mas logo desligado de suas funções.
Casou-se, então, com Maria dos Povos, a quem dedicou um de seus sonetos mais famosos. Vendeu as terras que recebera de herança e, segundo consta, guardou o dinheiro num saco no canto da casa, gastando-o à vontade e sem fazer economia. Ao mesmo tempo, tratou de exercer a advocacia, escrevendo argumentações judiciais em versos.
A certa altura, resolveu abandonar tudo e saiu pelo Recôncavo como cantador itinerante, convivendo com o povo, freqüentando as festas populares, banqueteando-se sempre que convidado. É nessa época que se avoluma sua obra satírica (inclusive erótico-obscena) que iria lhe valer o apelido de "Boca do Inferno". Mas foi a crítica política à corrupção e o arremedo aos fidalgos locais que resultaram em sua deportação para Angola.
De lá, só pôde retornar em 1695, com a condição de se estabelecer em Pernambuco e não na Bahia, além de evitar as sátiras. Segundo os estudiosos, nesses momentos finais de vida, tornou-se mais devoto e deu vazão à poesia religiosa, em que pede perdão a Deus por seus pecados. Morreu em data incerta no ano seguinte.
Vale lembrar que a fama de Gregório de Matos - um dos grandes poetas barrocos não só do Brasil, mas da língua portuguesa - é devida a uma obra efetivamente sólida, em que o autor soube manejar os cânones da época, seja de modo erudito em poemas líricos de cunho filosófico e religioso, seja na obra satírica de cunho popularesco. O virtuosismo estilístico de Gregório de Matos não encontra um rival a altura na poesia portuguesa do mesmo período.
Aspectos importantes sobre suas obras:
Para entender a obra de Gregório de Matos é preciso conhecer o contexto histórico no qual ele está inserido, uma vez que grande parte de sua poesia (principalmente a satírica) faz alusão a duas de suas maiores referências: o Brasil e Portugal. No final do século XVII, Portugal estava em decadência, sendo que o sistema escravocrata não conseguia mais sustentar a economia da Metrópole. Assim, Portugal impunha ao Brasil uma série de restrições comerciais a fim de conseguir vantagens. Por conta disso, os senhores do engenho e proprietários rurais brasileiros passaram a enfrentar uma forte crise econômica.
Em contrapartida à crise do mercado de escravos e do engenho de açúcar, surge uma rica burguesia composta por imigrantes vindos de Portugal e que comandavam o comércio na colônia. Esta rica burguesia dominou também o mercado de crédito e outros contratos reais. Por conta do monopólio gerado por estes imigrantes, agravou-se a crise dos proprietários rurais brasileiros e a hostilidade entre esses dois grupos foi crescendo ao longo dos anos.
Gregório de Matos, como filho de senhor de engenho e bacharel em Direito, encontra-se em uma posição central neste cenário, tendo condições de pensar e analisar seu momento histórico sob diversas perspectivas. Gregório de Matos, apesar de ter tido diversos cargos de poder, resolve desligar-se de tudo e viver à margem da sociedade como um poeta itinerante, percorrendo o recôncavo baiano e frequentando festas e rodas boemias. Porém, mesmo distanciado da sociedade hipócrita a qual ele condena, ele também se insere nela, pois Gregório ainda depende da nobreza e vive à custa de favores deles. Ao mesmo tempo, ele encara o papel do portador de uma "voz crítica" sobre essa mesma sociedade na qual ele se insere.
Conforme explica José Wisnik, o poema satírico de Gregório de Matos é marcado por essa "briga" entre uma sociedade "normal" - que é a do homem bem nascido" - e outra "absurda" - que é composta por pessoas oportunistas, mas que estão instaurados no poder. Porém, no caso de Gregório de Matos a "sociedade absurda" é real, pois é a Bahia onde ele vive; e a sociedade considerada "normal", que é a dos homens bem nascidos e cultos, é absurda perante a realidade baiana. Assim, ambas são consideradas absurdas uma perante a outra. Esse impasse é o da realidade histórica desse momento, coexistindo em um mesmo locas duas Bahia: uma "normal", que é vista com ar nostálgico, e outra "absurda" e amaldiçoada.
Se de um lado existe a obra satírica de Gregório de Matos, onde ele expõe e critica sem nenhum pudor a sociedade da época, de outro lado há também a poesia lírica produzida por ele. Seus poemas líricos são comumente divididos em: lírico-amorosos e burlescos/eróticos. Há ainda uma vasta produção de poemas com temática religiosa. Porém, há de se ressaltar que a ironia e crítica social existente nos poemas satíricos não são deixados de lado em sua produção lírica e religiosa.
Na poesia amorosa e erótica de Gregório de Matos, o tema básico continua sendo o choque de opostos: "espírito" e "matéria", "ascetismo" e "sensualismo". Essa visão dualista também aparece na figura da mulher desejada, sendo que esta representa uma espécie de "anjo-demônio". É interessante notar que na obra de Gregório de Matos o "outro lado" em um par de opostos sempre irá conter um pedaço do seu par antagônico. Ou seja, se tomarmos por exemplo a figura da mulher, quando ela aparece como um ser angelical, ela também terá uma parte demoníaca, e vice-versa.
Dessa forma, a poesia lírico-amorosa de Gregório de Matos é construída em torno de contradições e pares de opostos, utilizando figuras de linguagens como o oximoro, que reforça essas contradições. Porém, deve-se ter em mente que estas contradições não se anulam e a mensagem final que o poeta passa é de que "diferença é identidade". Já a poesia erótica de Gregório de Matos, na qual o poeta utiliza uma linguagem mais direta e explícita do que na lírico-amorosa, o amor carnal aparece como forma de libertação do corpo e, por consequência, do indivíduo também.
Por fim, tem-se a poesia religiosa de Gregório de Matos, que também é trabalhada constantemente através de pares de opostos. O ambiente fortemente cristão do período barroco, faz-se presente aqui, onde os pares antagônicos da vez é a "culpa" versus "perdão". Gregório de Matos faz uso da poesia para se libertar e ela é a única forma possível de salvação para o poeta. Esta salvação não se dá somente entre o poeta e Deus, mas também perante a sociedade e si mesmo.
Fontes:
http://educacao.uol.com.br/biografias/gregorio-de-matos.htm
http://guiadoestudante.abril.com.br/estudar/literatura/gregorio-matos-poemas-escolhidos-analise-obra-gregorio-matos-703822.shtml
Coloquem referência neste texto.
ResponderExcluirFeito!
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